Evolução dos Parlamentares do Congresso Nacional com Carreira Policial e Militar

Por Gabriel Santos*

Durante as discussões que envolveram o Estatuto do Desarmamento em 2003, o qual foi promulgado como Lei nº 10.826 em 22 de dezembro daquele mesmo ano, surgiu o termo popularmente conhecido como "Bancada da Bala".

Oficialmente chamada de Frente Parlamentar de Segurança Pública, o grupo viria a se tornar posteriormente um espaço influente no cenário das reivindicações acerca dos temas referentes à segurança pública e que estão em pauta no Congresso Nacional, ultrapassando os seus mais de 300 membros.

Nesse contexto, personalidades políticas como Jair Bolsonaro (então do PP/RJ), e Alberto Fraga (na época do PMDB/DF), começaram a ser reconhecidos como os principais líderes do colegiado, cuja relevância e apoio cresceram significativamente ao longo dos anos seguintes, principalmente com a eleição de Bolsonaro para o cargo de presidente da República em 2018.

Em consulta histórica, até 2014 o discurso favorável ao armamento, às abordagens punitivistas e aos interesses corporativos das forças de segurança e militares, não conseguiu conquistar grande influência no contexto político brasileiro. Tanto é que Fraga, que liderou as discussões sobre o Estatuto no PMDB, acabou sendo expulso do partido devido às suas posições sobre o tema.

Entretanto, o cenário político começou a se transformar em 2015, quando o Partido dos Trabalhadores (PT) teve dificuldades em orientar os parlamentares do Congresso de acordo com os interesses de sua agenda política e quando Eduardo Cunha (PMDB/RJ) assumiu a presidência da Câmara dos Deputados.

Naquele ano, a Casa aprovou medidas como a redução da maioridade penal, através da PEC 171/1993, (um tema que ainda aguarda deliberação no Senado) e a Comissão Especial do Desarmamento deu sinal verde para a revogação do Estatuto (uma pauta que ainda espera deliberação no Plenário da Câmara). Vale ressaltar que a criação de comissões especiais para tratarem de assuntos específicos requer a aprovação do presidente da Câmara dos Deputados, que na época era ocupado por Cunha.

Já em 2018, com a campanha presidencial de Jair Bolsonaro, a ideologia associada à "Bancada da Bala" ganhou notável influência. Exemplo disso foi a abertura da Comissão Especial de Ações Contraterroristas, a aprovação na Câmara dos Deputados da ampliação do direito de posse de armas para caçadores e colecionadores, por meio do PL 3723/2019 (Aguarda deliberação no Senado Federal), e ainda, a promulgação da Lei Ordinária 13.870, de 17 de setembro de 2019, que determinou a posse de arma de fogo em áreas rurais.

Aumento dos candidatos com carreira policial e militar nas eleições de 2022

Em 2022, de acordo com informações do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, as eleições gerais registraram 1.866 candidatos provenientes das forças de segurança pública e defesa, o que significa um aumento em relação aos 1.469 candidatos em 2018.

As unidades federativas com os maiores percentuais de candidatos das forças de segurança foram o Amazonas e o Distrito Federal, representando 11,3% e 10,1% do total de candidaturas locais, respectivamente.

No que diz respeito ao número absoluto de candidaturas, o Rio de Janeiro liderou com 251 nomes, seguido por São Paulo, com 238, e Minas Gerais, com 126. Esses três estados também possuem os maiores efetivos de policiais no país.

Em 2018, 89,9% dos candidatos que tinham origem nas carreiras de segurança pública concorreram às eleições representando partidos de direita e centro-direita. No entanto, em 2022, esse percentual aumentou para 94,9%, indicando um crescimento significativo na preferência desses candidatos por correntes políticas de orientação conservadora.

Parlamentares eleitos em 2022 com carreira policial e militar

Nas eleições de 2022 o Partido Liberal (PL) concentrou a maior parte dos candidatos oriundos das carreiras de segurança pública e chegou à marca de 18 candidatos eleitos. Esse número representa quase a metade, ou seja, 47%, do total de policiais militares, civis, federais e integrantes das Forças Armadas eleitos (Gráfico 1).

O partido União Brasil vem em segundo lugar, com 6 candidatos eleitos, seguido pelo Partido Progressista (PP) com 3 eleitos, o Republicanos com 2 eleitos, assim como o Movimento Democrático Brasileiro (MDB) e o Avante. Em contraste, na esfera política da esquerda, o Partido dos Trabalhadores (PT) foi o único partido a eleger uma deputada com perfil oriundo das carreiras de segurança pública (Gráfico 1).

Já no Senado Federal, dos 81 parlamentares que exercem a atual legislatura, dois deles vieram das forças armadas e integraram o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro: Hamilton Mourão (Republicanos/RS), que é general da reserva do Exército e Astronauta Marcos Pontes (PL/SP), tenente-coronel da Força Aérea Brasileira (FAB). É importante destacar que, desde 1988, essa é a primeira vez que candidatos oriundos das forças armadas são efetivamente eleitos como senadores da República (Gráfico 1).

Portanto, o atual quadro de parlamentares ligados à carreira militar conta hoje com o maior número da história, com 43 representantes na Câmara dos Deputados e 2 no Senado Federal (Gráfico 2).

 

GRÁFICO 1 - Parlamentares por partido com carreira policial e militar na atual legislatura

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GRÁFICO 2 - Evolução dos Parlamentares eleitos com carreira policial e militar

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Em relação à porcentagem desses parlamentares nas casas, a Câmara dos Deputados, que conta com o total de 513 deputados federais, tem 8,38% de parlamentares oriundos das forças militares. No Senado Federal, o número corresponde a 2,4% do total de 81 senadores.

Em termos práticos, a bancada não chega a influenciar significativamente as votações estratégicas ou de forte apelo popular para a agenda do país, mas reforça pautas corporativas e legislativas mais habituais ao espectro político conservador de direita, como a redução da maioridade penal e o endurecimento das penas dos crimes comuns, assim como o excludente de ilicitude para a categoria e a agenda armamentista, visando a facilidade de acesso às armas aos civis.

 

GRÁFICO 3 - Proporção dos parlamentares com carreira policial e militar na Câmara dos Deputados e no Senado Federal

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* Cientista político, especialista em relações governamentais pela Uninter, graduando em gestão pública pelo IFB, aluno especial do mestrado em poder legislativo pela Câmara dos Deputados e analista político da Pulso Público